Os estilos internos nunca chegaram a adquirir uma diversidade semelhante as das escolas externas. Indiretamente, sua origem pode ser atribuída a Dámó (達摩), devido à natureza suave dos exercícios que preconizava. Os estilos internos de kungfu (功夫, gōngfu) de nossa escola consiste em quatro estilos principais: Tàijíquán (揚式太極拳, Yáng shì Tàijíquán), Bāguà (八卦), Xíngyì (形意) e Bājí (八極). Geralmente estão ligados pela mesma filosofia daoista, com movimentos lentos e graciosos (embora o Xíngyì e Bājí consistam de movimentos repetidamente explosivos). O desenvolvimento do qì (氣) nesses estilos é focado mais diretamente e a energia interna é sempre utilizada ao invés da força muscular, de forma que o Tàijíquán utiliza a energia do próprio corpo, o Bāguà faz a energia circular e o Xíngyì e Bājí projetam a sua energia.

 

Dos estilos internos de kungfu, o mais popular é o Tàijíquán, que combina as formas tradicionais do kungfu com exercícios de energia interna, meditação e técnicas respiratórias. Numa tendência bem mais recente, sua prática está associada a uma série de exercícios saudáveis, praticado no intuito apenas da promoção da saúde. No entanto, quando ensinado corretamente e de forma verdadeira, respeitando e mantendo o seu lado tradicional, o Tàijíquán antes de tudo é um método de combate e todos os seus movimentos e posturas têm função definida na luta. Sua prática assegura um ótimo funcionamento dos órgãos internos, além de beneficiar diretamente o sistema nervoso central, o sistema respiratório e também, o circulatório. Usualmente, sua origem é creditada a Zhāng Sānfēng (張三丰), um monge daoista do século XII que teria vivido no monte Wǔdāng (武當山, Wǔdāng shān) e que acabou se tornando uma espécie de herói cultural, com sua história contada sempre de forma lendária. Algumas correntes históricas mais verossímeis creditam a criação do Tàijíquán para Chén Wángtíng (陳王廷), um general da dinastia Ming (明朝) que nasceu no norte da China, no vilarejo Chén Jiāgōu (陈家沟); e Jiāng Fā (將發), que estudou artes marciais em Shānxī (山西), vivendo em Chén Jiāgōu posteriormente, aonde ajudou no desenvolvimento da arte da família Chén. Comumente considera-se que Chén Wángtíng e Jiāng Fā não possuíam um relacionamento de mestre e aluno e sim uma relação de amizade que se influenciaram mutualmente em benefício do desenvolvimento do Tàijíquán. Mestre Chan Kowk Wai ensina o estilo Yáng de Tàijíquán que foi criado por Yáng Lùchán (楊露禪) a partir de uma derivação do estilo Chén. A forma Yáng ensinada atualmente foi desenvolvida pelos filhos de Yáng Lùchán, Yáng Jiànhòu (楊健候) e Yáng Bānhóu (楊班侯). O general Lǐ Jǐnglín (李景林) aprendeu o estilo de Yáng Bānhóu e o transmitiu para o Mestre Gù Rǔzhāng (顧汝章). Além da forma de mão (128 Lù Yáng Bānhóu Jiànhòu Tàijíquán, 128 路楊班侯健候太極拳), Mestre Chan também ensina uma forma de lança, um kati combinado, facão e a espada de Tàijí da família Wú (吳家, Wú jiā).

Da esquerda para direita: Yáng Jiànhòu, Yáng Bānhóu e Yáng Lùchán


O Bāguà zhǎng (八卦掌), por sua vez, já é um estilo de kungfu bem menos conhecido se comparado ao Tàijíquán. Suas técnicas são baseadas nos trigramas do Yìjīng (易經; ou I Ching, como é conhecido mais popularmente), o livro das mutações. O texto clássico do Yìjīng consiste numa das obras literárias mais importante escrita na China e nela é demonstrado que o nosso universo existe em permanente mutação. Com isso, a movimentação do Bāguà também se faz de forma contínua. Cada trigrama pertencente ao diagrama do Bāguà possui suas próprias características, as quais são aproveitadas nas técnicas. Com a mutação causada pelo movimento e pelas técnicas usando os trigramas, o qì se movimenta conjuntamente e atua diretamente no combate. Existem diversas versões referentes à criação deste estilo, porém a usual é creditada ao mestre Dǒng Hǎichuān (董海川), um profundo conhecedor do estilo Luóhàn (羅漢) de kungfu. Mestre Dǒng Hǎichuān teria aprendido as técnicas de Bāguà de um monge daoista eremita, em alguma remota montanha na parte rural da China. O Bāguà teria sido criado durante a dinastia Qing (清朝, Qīng Cháo), unindo seus conhecimentos de kungfu com essas técnicas daoista e usando como base as leis do Yìjīng. Muitos dos principais alunos do mestre Dǒng hǎichuān eram conhecedores de diversos estilos de kungfu, o que acabou por acarretar uma série de variações de sua forma original. Apesar das significativas variações e de ter originado uma diversidade muito grande de ramificações, os princípios fundamentais do Bāguà permaneceram inalterados. Mestre Chan Kowk Wai ensina as linhagens da família Sūn, criada pelo lendário mestre Sūn Lùtáng (孫祿堂), um dos maiores responsáveis pela difusão e desenvolvimento do Bāguà na era moderna, oriundos dos ensinamentos de Chéng Tínghuá (程廷華); e Bāguà da família Fù, criado por Fù Zhènsōng (傅振嵩).


Da esquerda para direita: Dǒng Hǎichuān, Chéng Tínghuá, Sūn Lùtáng e Fù Zhènsōng 

As técnicas do Bāguà incluem ataques de mão aberta e fechada, torções e chaves, chutes, rasteiras e projeções. Existem oito tipos de posições de palmas e oito tipos de movimentação com os pés, cada um associado a um trigrama de Bāguà. O principal objetivo desse estilo é causar o desequilíbrio do oponente sem que haja necessidade de feri-lo. A sua movimentação de pés através dos oito passos compreende seu elemento fundamental. O praticante desse estilo circula ao redor de seu oponente, estudando-o de forma que possa definir seus pontos fracos e fortes, procurando se posicionar de forma que fique afastado dos pontos fortes do adversário, aguardando o melhor momento para entrar na guarda de seu oponente. Na sua movimentação que é feita em círculo, num padrão de movimentação retilínea e circular de oito passos, o praticante age movendo pernas, tronco e braços simultaneamente, aonde o oponente é o centro desse círculo. Mestre Chan Kowk Wai ensina cinco formas de mão (duas do estilo Sūn e três do estilo Fù), mais uma rotina combinada e armas como a espada e o facão. Mestre Chan prendeu a linhagem Sūn do Mestre Yán Shàngwǔ (Yim Sheung Mo, 嚴尚武) e a linhagem Fù de Fù yǒnghuī (傅永輝).

Mestre Chan Kowk Wai: Bāguà zhǎng 

 

 

O Xíngyì (形意) se difere um pouco do Tàijíquán e do Bāguà por enfatizar o uso dos punhos fechados. É o mais impetuoso dos estilos internos de kungfu. Por ser muito explosivo e incisivo, seu desgaste energético é muito grande, obrigando seu praticante a possuir um mecanismo de reposição de energia interna eficiente. Possui um qìgōng (氣功) muito poderoso que permite a reposição energética despendida com uma única respiração. Toda sua filosofia está centrada no combate real e é caracterizado pelo seu dinamismo, aonde a parte prática e as aplicações na luta são extremamente enfatizadas. Sua origem está enraizada nas batalhas pelas quais a China vivenciou no final do século XIX. O Xíngyì consiste num dos mais fortes estilos de kungfu já criados e que revelou grandes mestres como Guō Yúnshēn (郭雲深), Sūn Lùtáng (孫祿堂) e Wáng Xiāngzhāi (王薌齋). A técnica do Xíngyì preconiza que o punho fique relaxado até o instante do impacto, quando ele é cerrado de forma súbita e a energia é projetada. Seus socos são ataques muito poderosos que visam tirar o oponente de ação no primeiro golpe. Suas técnicas são de características agressivas, sendo que o praticante se movimenta para dentro do adversário com ofensivas fulminantes onde a energia do corpo inteiro é canalizada em uma única descarga, liberada num único movimento explosivo. O Xíngyì preconiza a economia de movimentos com ataques e defesas simultâneos. Sua movimentação é predominantemente linear, sendo que as mãos, os pés e o tronco se movimentam em conjunto. Criado em torno de 1600 por Jī Lóngfēng (姬龍峰; também conhecido como Jī Jìkě, 姬際可), o Xíngyì quán possui sua origem no estilo Liùhé quán (六合拳), originário do templo de Shaolin (少林寺, Shàolín sì), tornando-se conhecido por intermédio de Guō Yúnshēn (herdeiro da 5ª geração). Existem diversas escolas de Xíngyì, todas com características distintas, sendo que as de Héběi (河北), Shānxī (山西) e Hénán (河南) são consideradas as principais.

Mestre Chan Kowk Wai: Xíngyì quán 

 

O Bājí quán (八極拳) é um estilo simples e efetivo, caracterizado por sua extrema potência. Com movimentação rápida e direta, sua aplicação em combate normalmente é utilizada com ataques a curta distância. De etnia Huí (回族, Huízú), o estilo Bājí de kungfu é originário da província de Héběi (河北) e sua criação é atribuída a Wú Zhōng (吳鍾). Ganhou notoriedade somente dois séculos depois por intermédio do mestre Lǐ Shūwén (李书文). A origem do nome do estilo, as “oito extremidades”, geralmente é interpretada de duas formas: o treinamento efetivo de oito partes do corpo (cabeça, ombros, cotovelos, mãos, quadris, joelhos, tornozelos e pés) para atingir a maior eficiência no combate; e a execução das técnicas em oito direções diferentes, que seria uma referência ao clássico daoista Yìjīng (易經), significando algo no sentido de “incluir tudo” ou “universo”. O Bājí ensinado em nossa escola provém do mestre Lǐ Jǐnglín (李景林), famoso espadachim de Wǔdāng (武當) e que ensinou posteriormente o Mestre Gù Rǔzhāng (顧汝章).  

ACADEMIA SINO-BRASILEIRA DE KUNGFU
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